quinta-feira, outubro 28, 2010

A metáfora da vida é o ônibus da linha 333


Nasci numa época que a metáfora da vida era o trem. Ouvia-se dizer que fulano perdeu o trem da história. Outro já pegou o bonde andando. Para perceber o valor de um minuto, pergunte a uma pessoa que perdeu um trem. Pobre com bagagem perde o trem.

Para mim, a metáfora é o ônibus. No 333, que me deixa na UEPB, observo um mundo em miniatura. É ali que vejo os jovens, recém-saídos da adolescência, descobrirem a paixão. Vão de mãos dadas até a universidade, num calor de matar qualquer um.

É no busão que vemos alguns motoristas maltratarem os idosos, como se fossem cães sarnentos. Mas é, também, onde notamos outros motoristas e cobradores demonstrarem gentilezas com gestantes e mães com crianças de colo. Percebemos que nem todos são iguais e não é o hábito que faz o monge.

Vejo ainda, quase diariamente, marmanjos fingirem sono profundo para não cederem seus lugares para idosos, pessoas com deficiências e portadores de necessidades especiais. No entanto, observo estudantes carregarem o material daqueles que não têm espaço para sentar.

É na fila de entrada e saída do lotação que entendemos a competição da sociedade capitalista, pós-industrial, pós-tudo cantada pelos sociólogos. Na fila, esta síntese do sucesso individual, entendemos a lei do mais forte, a falta de camaradagem e o “quando a farinha é pouca, meu pirão primeiro”.

Sem contar que no coletivo sempre tem um chato que nos grita, com seus celulares-último-modelo, intimidades que meus avós não confessariam nem na intimidade da alcova. Será que eles não entendem que não queremos saber o que fizeram ou estão em vias de concluir?

No busão, sei quais as músicas que estão no hit parade, pois sempre tem alguém disputando qual é o celular de maior potência sonora. Ligam-nos, em toda altura, sem nos perguntar o gosto musical. Não importa se as letras falam de preconceito. O importante é mostrarem os sons do momento.

Mas é no coletivo que pessoas de classes sociais diferentes se comprimem, sem terem pensamentos coletivizados. É no lotação, ainda, que se atritam estudantes de Medicina, Matemática, Psicologia, Biologia, Física, Odonto e Estatística..., garis, fiscais, carteiros, funcionários da UFCG e UEPB. Numa inter(ação) forçosa.

Quer saber como é vida dos estudantes e da classe trabalhadora de Campina Grande, tome o 333 desde a Catedral, passando pelo Hospital da FAP. Porém, deixe para descer na volta, quando ele passar pelo Monte Santo e Araxá. Observe quem são seus passageiros e descubra em que classificação você se encaixa.

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