segunda-feira, março 01, 2010

Narciso acha feio o que não é espelho


Esses dias, estávamos (uma amiga, o namorado, a vizinha deles e eu) caminhando às margens do Açude Velho, a nova Meca da geração saúde de Campina Grande, quando o assunto partiu para a estética. Segundo um dos caminhantes, nunca na História tivemos tantas informações, armazenadas e manipuláveis das mais diversas formas, porém, a beleza jamais tinha assumido tamanho destaque em detrimento da inteligência.

Eu, que aderi à pratica da caminhada há três meses e meio, fi-lo muito menos por questão de me tornar um  “homem sarado” (já que estou alguns quilos abaixo e não possuo a ambição de ser fisiculturista). Iniciei a atividade por recomendações médicas, devido à hipertensão arterial, herança genética combinada ao sedentarismo. Minha amiga aderiu à atividade para acompanhar o namorado, este com índices glicêmicos altos, e sua vizinha quer perder peso.

Depois de completar as voltas necessárias, começamos uma  conversa sobre estética versus inteligência.   Nesse instante,  minha amiga disse que  não se achava bonita, mas também não era a pessoa mais feia do mundo e completou: “Acho que quem olha para mim não se sente agredido por  minha beleza”. Nós rimos e seguimos viagem.

Vejam só a que ponto chegamos: a sociedade nos impõe padrões estéticos bem estranhos. A ideologia da beleza nos quer iguais, vendendo modelos que não conseguimos atingir, mesmo que passemos horas “malhando” nas academias, esses templos dedicados à Santa Estética, ou que tomemos os mais diversos “suprimentos alimentares”.

Uma pessoa que não se enquadra no padrão de beleza vendido na mídia, agride porque o olho daquele que observa a massa busca uma homogeneidade. Por isso que é preciso padronizar cabelos, peles, roupas e outros acessórios.  Aqueles que não se enquadram nesse protótipo são agressores, pois incomodam às retinas acostumadas a arquétipos (construídos pela indústria cosmética) que os vende como se fossem tão originais quanto o Natureza. A diferença agride, porque Narciso acha feio o que não é espelho. E entre limpar o espelho e mudar o ângulo da visão, é melhor refinar os objetos observados.

É um mau gosto ser diferente, um “descuido” ter uns quilinhos a mais, um desleixo ter cabelos cacheados ou mesmo um problema de saúde ter uma pele daquele outro jeito. Valem-se da máxima “saúde é beleza”, logo, quem não é belo é doente. Exemplo disso é vocabulário dos amantes do “fitness”. Eles são sarados (saudáveis), porque malham (forjam) seus corpos, esculpem (como se fosses estátuas gregas), mesmo que essas máquinas sejam projetadas à base de anabolizantes.

E quem não se molda na academia, esculpe-se nas clínicas de cirurgias plásticas. Afinal de contas, feiura tem remédio:  plastifique-se. A recuperação é rápida e o valor da reforma pode ser dividido nos cartões de crédito. É só ter cuidado ao escolher o médico, senão pode-se morrer durante a lipoaspiração, mas pelo menos se chega recauchutada no céu, ou não.

Os que não rezam no catecismo da Santa Estética, são raquíticos (sofrem de raquitismo), magricelas que não conseguirão vencer nem a si mesmos, uns perdedores com pouca chance de ter sucesso. Ou gordos (preguiçosos e descuidados).

Se levarmos em conta a tese de minha amiga, além de agressor eu sou um pária. Estou vendo a hora ser enquadradado no “estatuto da beleza”, como um vândalo, desordeiro que deve ser banido da sociedade padronizada, pois coloco em risco o modelo vigente.


Um comentário:

  1. É verdade Zélio. Infelizmente, a sociedade tomou um rumo que só enxerga externamente as pessoas.

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